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Regulamentar a “rede sósias” é um erro que ameaça a liberdade e abre espaço para censura política

Nos últimos meses, ganhou força no Congresso a discussão sobre regulamentar as chamadas “redes sósias” — plataformas e perfis que imitam visualmente ou funcionalmente redes sociais já existentes, ou que permitem a criação de contas falsas, clones e paródias. A proposta, defendida como forma de “proteger a autenticidade e combater golpes”, levanta um debate crucial: até que ponto o Estado pode intervir no funcionamento das plataformas sem sufocar a liberdade de expressão, a inovação tecnológica e a pluralidade de ideias?

O que é a “rede sósias”

O termo vem sendo usado de forma ampla para se referir a dois fenômenos distintos:

  1. Plataformas clonadas — aplicativos ou sites que imitam a interface e recursos de redes famosas.
  2. Perfis imitadores — contas que reproduzem nomes, imagens e até comportamentos de pessoas ou marcas.

A proposta de regulamentação pretende exigir identificação obrigatória, registro junto a órgãos oficiais e autorização prévia para o funcionamento dessas plataformas e contas.

Por que a regulamentação pode ser um erro

  1. Ameaça à liberdade de expressão
    Perfis de paródia, sátira política e humor seriam diretamente impactados. O humor é um instrumento histórico de crítica social, e limitar a criação de personagens fictícios abre brechas para censura.
  2. Porta aberta para censura política
    Ao dar ao Estado o poder de decidir quais plataformas e contas podem existir, cria-se um terreno fértil para perseguição a críticos do governo. Modelos autoritários como o da China mostram que leis vagas podem ser usadas para apagar conteúdos contrários à narrativa oficial, sufocando o debate público.
  3. Risco à inovação
    Muitas plataformas surgem inspiradas em redes existentes, mas evoluem para oferecer recursos melhores. Regulamentar de forma restritiva pode matar startups e desestimular novos empreendedores digitais.
  4. Concentração de poder
    Grandes empresas de tecnologia poderiam usar a lei para sufocar concorrentes menores, alegando “similaridade indevida”, mesmo que não haja violação real de direitos autorais ou marcas.
  5. Problemas de aplicação prática
    Determinar o que é “imitação” ou “sósia” é subjetivo. Uma interface parecida pode ser fruto de padrões de usabilidade universais, não de cópia.
  6. Leis já existentes cobrem os abusos
    Casos de fraude, golpes e uso indevido de imagem já são punidos pelo Código Penal, pelo Marco Civil da Internet e pela Lei de Direitos Autorais. Criar novas regras pode resultar em sobreposição legal e insegurança jurídica.

O risco para o usuário comum

Ao impor identificação e registro, a regulamentação pode reduzir a privacidade, obrigando usuários a entregar dados pessoais para criar perfis, inclusive de humor ou opinião política. Isso abre caminho para vigilância excessiva e intimidação de vozes críticas.

Conclusão

Proteger cidadãos de golpes é essencial, mas o caminho não é criar uma lei ampla e vaga que possa ser usada para censurar, punir criadores de conteúdo e sufocar a competição tecnológica. Combater crimes digitais requer aplicação efetiva das normas já existentes, educação digital e fortalecimento dos mecanismos de denúncia — não uma regulamentação que transforme a internet em um espaço controlado como nos regimes autoritários.

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