Quando o Brasil ajudou a China a dominar porta-aviões e desafiou os EUA
Pouca gente sabe, mas no início dos anos 2000 a Marinha do Brasil desempenhou um papel estratégico no avanço militar da China. Em um movimento quase improvável, mas de grande impacto geopolítico, o Brasil abriu caminho para que Pequim desse o salto necessário rumo à construção e operação de porta-aviões – algo que mudaria o equilíbrio de forças no cenário internacional.
A ambição chinesa e a lacuna naval
A China já havia definido, no começo do século, a meta de se tornar a maior potência militar do planeta até 2050. Mas havia um ponto frágil: sua Marinha. Para rivalizar com os Estados Unidos e projetar poder além de suas fronteiras, Pequim precisava dominar a operação de porta-aviões – navios capazes de transportar caças e helicópteros para missões de longo alcance.
Na época, apenas quatro países tinham esse conhecimento consolidado: Estados Unidos, França, Rússia e Brasil. Mas nenhum deles, exceto os brasileiros, se mostrava disposto a transferir experiência. Washington via Pequim como ameaça, Paris não queria contrariar a OTAN, e Moscou desconfiava da China por acusações de espionagem tecnológica.
Foi nesse cenário que a Marinha do Brasil, que operava o porta-aviões A-12 São Paulo, tornou-se peça-chave para os planos chineses.
Lula, Jobim e o acordo inédito
A guinada política brasileira após a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva, em 2003, também abriu espaço para novas parcerias. O governo buscava maior aproximação com países como China, Irã, Cuba e Venezuela, rompendo com o alinhamento automático aos EUA.
Em 2009, o então ministro da Defesa, Nelson Jobim, confirmou publicamente a cooperação com a China. Na mesma época, o comandante da Marinha, almirante Júlio Soares de Moura Neto, participou de encontros em Pequim voltados à modernização da frota local.
A parceria previa que militares chineses recebessem treinamento com apoio brasileiro, especialmente na preparação de tripulações e procedimentos de operação em alto-mar – último passo que faltava para que Pequim dominasse a doutrina dos porta-aviões.
Do São Paulo ao Liaoning
Três anos depois, em 2012, a China colocou em operação o Liaoning, seu primeiro porta-aviões. Originalmente soviético, o navio havia sido comprado da Ucrânia, mas foi adaptado e transformado em peça central para o aprendizado chinês.
O salto foi rápido. Hoje, a Marinha da China já conta com três porta-aviões, incluindo o moderno Fujian, lançado em 2022, e se consolidou como a segunda maior força naval do mundo. Analistas do Center for Strategic and International Studies (CSIS) destacam que, sem o auxílio brasileiro, o processo teria sido mais lento e custoso.
O contraste com a realidade brasileira
Enquanto a China colhe os frutos, a situação do Brasil seguiu outro rumo. O A-12 São Paulo, orgulho da Marinha no início dos anos 2000, foi desativado, ficou meses à deriva e acabou afundado no Atlântico em 2023.
A cooperação que poderia ter dado prestígio internacional ao Brasil hoje levanta dúvidas: o país realmente ganhou influência ou apenas forneceu conhecimento estratégico a uma potência que, agora, projeta seu poder global até mesmo sobre a América Latina?