Empresários e líderes indígenas são acusados de grilagem de terras no Piauí; duas prisões foram feitas
A Polícia Federal (PF) deflagrou, nesta quarta-feira (19), a Operação Aldeia Verde contra um grupo acusado de grilagem de terras pertencentes à comunidade indígena Akroá-Gamella, no Cerrado piauiense. O esquema resultou na venda ilegal de terras em quatro municípios do estado, levando à prisão preventiva de duas pessoas.
Segundo a PF e o Ministério Público Federal (MPF), o grupo era composto por empresários, funcionários públicos, líderes sindicais, corretores de imóveis e dez lideranças indígenas. A investigação revelou que eles utilizavam violência e ameaças para expulsar os antigos ocupantes e forjavam documentos para vender áreas protegidas. No total, 6.600 hectares foram invadidos entre 2021 e 2023.
As buscas ocorreram em cinco cidades: Teresina (PI), Currais (PI), Bom Jesus (PI), Mamborê (PR) e Maringá (PR). Os envolvidos foram denunciados à Justiça por crimes como invasão de terras da União, falsificação de documentos, corrupção ativa e passiva, porte ilegal de arma, ameaça, incêndio e associação criminosa.
Como funcionava o esquema
A PF identificou que o grupo atuava da seguinte forma:
- Identificação das terras: intermediadores escolhiam áreas tradicionalmente ocupadas pelos indígenas e passíveis de apropriação ilegal.
- Captação de compradores: empresários do agronegócio eram atraídos com a promessa de regularização fundiária e preços abaixo do mercado.
- Cooptação de posseiros: moradores locais, próximos ao cacique, recebiam dinheiro, alimentos, materiais de construção e até armas para ocupar as terras.
- Uso de “laranjas”: os posseiros emitiam procurações para que intermediários representassem seus interesses e negociassem as terras.
- Fraude documental: o grupo falsificava certidões e solicitava a regularização das terras junto ao Instituto de Terras do Piauí (Interpi), contando com a facilitação de agentes públicos mediante pagamento de propina.
De acordo com o MPF, empresários investiam grandes quantias no esquema, mas ainda assim abaixo dos valores de mercado, utilizando falsas escrituras e documentos fraudulentos para adquirir as terras.
Ação judicial e impactos na comunidade
Em setembro de 2024, o MPF entrou com uma ação civil pública contra a União e a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), cobrando a demarcação do território Akroá-Gamella no prazo máximo de um ano. O órgão argumenta que a demora da Funai tem agravado os conflitos na região, expondo os indígenas a constantes ameaças e expulsões.
Líderes da comunidade relatam que sofrem atentados há anos, incluindo invasões, roubos de documentos, ameaças de morte e incêndios criminosos em roças e moradias. Em 2022, casas da comunidade foram incendiadas no povoado Barra do Correntinho, levando à prisão de dois suspeitos.
Atualmente, a terra habitada pelos Akroá-Gamella tem 19.780 hectares, mas ainda não foi oficialmente demarcada pela União. O Interpi afirma que há sobreposição com propriedades privadas e um assentamento agrícola reconhecido pelo estado, onde vivem cerca de 300 pessoas.