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Como o Congresso mudou regras que permitiriam evitar fraudes bilionárias no INSS

Investigação da Polícia Federal aponta que fraudes causaram prejuízo de R$ 6 bilhões; mudanças aprovadas pelo Legislativo flexibilizaram medidas de controle.

As fraudes envolvendo descontos indevidos em benefícios de aposentados e pensionistas do INSS poderiam ter sido evitadas desde 2019. No entanto, alterações feitas pelo Congresso Nacional em medidas enviadas pelo Executivo permitiram que irregularidades continuassem, resultando em prejuízo estimado de pelo menos R$ 6 bilhões, segundo a Polícia Federal.

Em 2019, o então presidente Jair Bolsonaro enviou ao Congresso a Medida Provisória (MP) 871, que entre outros pontos determinava a revalidação anual de descontos feitos por associações nas contas dos beneficiários do INSS — uma tentativa de coibir práticas abusivas. O texto, no entanto, foi alterado por deputados e senadores, que ampliaram o prazo para revalidação para três anos, a partir de 31 de dezembro de 2021.

Antes que a regra entrasse em vigor, outra MP, a 1006, foi enviada pelo governo federal em 2020, adiando a exigência da revalidação, sob a justificativa da pandemia de Covid-19. A proposta também foi aprovada pelo Congresso.

Em 2022, mais uma mudança decisiva: a MP 1107, originalmente destinada a instituir o Programa de Simplificação do Microcrédito Digital, foi aprovada com a inclusão de um “jabuti” — dispositivo estranho ao tema principal — que revogou de vez qualquer prazo para a revalidação dos descontos associativos.

Desde 1991, a legislação permite que entidades realizem descontos diretamente na folha de pagamento de beneficiários da Previdência, desde que haja autorização expressa do aposentado ou pensionista. Porém, segundo a investigação da Polícia Federal, associações estariam realizando cobranças sem a devida autorização, prática que teria se intensificado a partir de 2019.

O escândalo já levou à demissão do ex-presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, e do ex-ministro da Previdência, Carlos Lupi. O governo federal iniciou um processo de ressarcimento, e mais de 2 milhões de beneficiários já relataram ter sido vítimas dos descontos indevidos e pediram a devolução dos valores.

Congresso discute mudanças

Em audiência no Senado nesta semana, o ministro da Previdência Social, Wolney Queiroz, admitiu a possibilidade de revisão das regras, mas ressaltou que qualquer alteração precisa ser feita pelo Congresso.

“Acho que isso tudo vai ser reavaliado pelo governo, porém, o desconto em folha foi instituído por uma lei deste Congresso. Então, se este Congresso achar por bem que acabe qualquer tipo de desconto em folha, caberá ao Congresso regulamentar”, afirmou.

Queiroz também atribuiu a ampliação dos golpes às mudanças legislativas que flexibilizaram a necessidade de revalidação dos descontos, prolongando prazos e dificultando o controle.

Na Câmara dos Deputados, tramita um projeto de lei de autoria do deputado Sidney Leite (PSD-AM) que visa proibir descontos de entidades associativas na folha de pagamento de aposentados e pensionistas. O projeto recebeu pedido de urgência, mas ainda não há data prevista para votação.

A proposta revoga a autorização para que sindicatos e associações realizem descontos diretamente nos benefícios, como ocorreu nos casos investigados. Ficam mantidas, porém, outras deduções previstas em lei, como contribuições obrigatórias à Previdência, Imposto de Renda, pensão alimentícia e pagamento de empréstimos e financiamentos.

Atualmente, ao menos 52 projetos tramitam na Câmara com o objetivo de fortalecer mecanismos de combate a fraudes no INSS. As propostas incluem medidas como o ressarcimento em dobro dos valores desviados e o endurecimento de penas para crimes contra aposentados e pensionistas.

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